"A penicilina cura os homens, mas é o vinho que os torna felizes."
(Alex Fleming)
Jantar vinico! Confesso que não me entendo com a expressão: jantar de vinhos? Sim, e entâo? Não é assim sempre, para quem tem a felicidade de gostar e poder beber?
Para mim, o vinho faz parte do jantar, refeição de relaxe, por excelência. Posso apreciar uma simples salada, um pedaço de queijo e...lá está ele, no copo, à minha frente, ufano, a mostrar-se em mil brilhos, seja branco ou tinto, ou ambos. Complementa uma refeição. Dá-lhe vida. Põe-nos de bem com a vida.
Mas, para mim, vinho sem gastronomia perde todo o encanto e prazer. É da harmonia entre o copo e o prato que tiro toda a magia da mesa, com boa companhia, claro está, que comer sozinha serve para matar a fome, mas é como um pãozinho sem sal: insonso! Fraquezas!
Garantida a melhor companhia do mundo, pelo menos a do meu mundo, registei uma newsletter no mail que me daria as duas outras componentes para completar a trilogia.
Um jantar com vinhos da Quinta de Sant’Ana a servir de pretexto, se é que são precisos pretextos para ir ao Gspot.
E lá estavam os donos da Quinta, James e Ann Frost , um inglês e uma alemã, com o enólogo português António Maçanita, a dar a cara por um projecto que ensaia os primeiros passos na Estremadura, numa quinta vizinha à Tapada de Mafra.
Ainda antes de me sentar à mesa, recebo à prova um copo de Rosé 2009, fresco, mas com pouco aroma, com final doce e um grande ponto de interrogação à frente: porquê esta moda, agora, de todos os produtores fazerem rosé?
Adiante, que de vinhos não percebo nada e a parte mais interessante é já quando estou de garfo e faca. Para entreter, mexilhão gratinado com molho holandês, salada de aipo, pêra e feijão verde, cru, cortadinho como se fosse cebolinho. O toque de irreverência que me pôs com todos os sentidos em alerta máximo!
No copo, um Alvarinho 2009, já que irreverência com irreverência se paga e é reconhecidamente ousado usar Alvarinho na Estremadura! Mas este Quinta de Sant’Ana não é um Alvarinho puro, fico a saber logo de seguida. Para a mistura entra o Verdelho e o Riesling. Duas castas portuguesas e uma alemã a darem corpo à etimologia do projecto. Mas, “não é um vinho de frutinha” avisa o enólogo. Já eu tinha percebido. Tem boca, mas não tem aroma. Estrutura tensa, oiço dizer e...recomeça aqui a minha admiração pelos adjectivos que os entendidos usam para descrever um vinho!
Um vinho tenso? Uhmmm??? Que quererá isso dizer?
Com tanto stress que a vida nos oferece hoje em dia e ainda temos que contar com mais esta...
Já a conversa ía animada, quando chegaram as vieiras salteadas com consomé de ervilhas, creme de citrinos e romanesco. A couve, em crocante caramelisado para dar textura ao prato. Toque exótico: umas ervilhas com wasabi, a pontuar. O estomago já mais calmo, apesar de no copo continuar o tal vinho tenso...Seja! Tenso ou não, a mim, o que sobressai, é a falta de aroma.
Estava eu ainda nos pontos de exclamação e já o copo tinha sido trocado pelo Sauvignon Blanc 2008. Mais um vinho contido no aroma! No prato estava um pregado envolto em massa Brick, puré de couve flor e alcachofras salteadas. Ao meu lado, gente entendida, fala-me em relva cortada e...Uau!!! Fico zonza com tão apurado palato! REL-VA-COR-TA-DA?! Cheiro a relva, sei o que é, mas qual será o sabor da dita? Um golo e outro e mais outro. Procuro essa reminiscência no copo, mas definitivamente...não tenho jeito para ruminante! Volto a minha atenção para a comida. O peixe fresquissimo, com o brick finissimo e bocadinhos inteiros de couve flor a emprestar crocante ao puré. Muito Bom.
“Já estávamos a pedir aroma!” é a exclamação que me chega do lado quando saltamos dos brancos para o tinto. Homenagem ao Baron Gustav Von Fürstenberg 2007. Na boca, um vinho suculento, com corpo. A prova mais interessante da noite, com comida a condizer: “Bife” de rabo de boi com orecchietti salteado e molho de frutos vermelhos. Um naco em forma de bife com cogumelos shitake, tudo embrulhado em redenho. Ui, ui! Sabor bem apurado, a satisfazer o palato mais exigente. A contribuir para o mimo do prato, um inspirado detalhe de “pintas” de iogurte grego com funcho e rábano, a emprestarem frescura. Casamento aprovado.
E o final só não foi feliz porque o moscatel de consumo caseiro ficou áquem das expectativas. Salvou-se o creme brulée, flor de laranjeira, espuma de chocolate branco e gelado de noz. Tudo a saber assim, como é descrito. A merecer vénias.
Alexandre Dumas dizia que “o vinho é a parte intelectual da comida”. Seja! Ignorante me confesso, rendida a tamanha sabedoria, mas só respondo pelo que me sabe bem!
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