“O prazer da comida é o único que, desfrutado com moderação, não acaba por cansar”

Brillat-Savarin


quarta-feira, 16 de março de 2011

Eleven - Sinfonia em onze andamentos

Leio, algures, que o Eleven apresentava como principal novidade na carta um novo menu surpresa:
Eleven em 11 Pedaços – Um novo menu surpresa para os jantares oferece uma viagem pela cozinha de Joachim Koerper em 11 momentos, descobrindo pratos da estação e alguns clássicos que o Chefe foi criando ao longo da sua carreira. Este menu, a 44 euros, renova-se semanalmente.
Fico curiosa, apesar de desconfiada. É que das quatro ou cinco vezes que fui a este restaurante, saí sempre defraudada com as experiências.
Nunca mais esqueço, por exemplo, a primeira vez que lá jantei, já o Eleven tinha conquistado uma estrela Michelin. Foi pedido o menu de trufas. Sem história, não me ficou na memória dos paladares. Mas, lembro-me bem como terminou esse jantar.
Sobremesa composta por um petit gateau e gelado de trufas, o meu espanto foi enorme quando enterro a colher no bolo e descubro uma massa seca. Completamente cozida, sem uma única gotinha de chocolate. Podiam chamar-lhe um queque, ou qualquer coisa do género, mas petit gateau é que não! Bolo seco no meu prato, e também no prato da frente!
Chamado o chefe de sala, e dada a nota da secura dos bolos, que um azar acontece, até aos melhores, a resposta foi rápida e desconcertante: - “tem graça, já é a quinta reclamação, esta noite!”.
Fiquei atónita. Tem graça? Quinta reclamação? E não acontece nada? E, confessa-se assim, de pronto, o erro, sem emenda?  E não se passou mesmo mais nada. A sobremesa não foi substituida. O valor dos menus, cobrado na integra. Não achei graça nenhuma, não senhora e...e se eu fosse inspectora do Guia Michelin o Eleven tinha perdido a estrela ali.
Fui lá mais duas ou três vezes, empurrada por compromissos sociais e tive sempre a mesma sensação. O serviço da sala não acompanhava a cozinha de Koerper e o chefe cozinheiro também não deveria ligar muito ao que se passava nas mesas. Por isso, foi sem surpresa que vi desaparecer a estrela.
Mas o meu espírito cristão obriga-se a dar várias oportunidades, e tinha curiosidade em ver como o Eleven estava a reagir à despromoção da biblia vermelha.
A contrariar os sinais da crise, numa destas sextas-feiras à noite, percorro a minha lista de restaurantes, sem sucesso na reserva para jantar;  o Eleven surge-me como quinta opção, mas, também ele, com lotação esgotada.
Insisto, com mais sorte, na semana seguinte. Peço mesa à janela.
Quatro variedades de pão à escolha. Bom pão, embora ganhasse se os pãezinhos fossem servidos quentinhos. Uma rodela de manteiga que aqui ainda não se renderam ao couvert de azeite.
Consulto a carta, num exercício gratuito, decidida que estava a optar pelo Menu de 11 pedaços. Venham eles, que a degustação apresenta-se de surpresa!
Primeira ronda: um carpaccio de tamboril, um tártaro de salmão, uma almondega de cogumelos trufados e, se a memória não me atraiçoa, lombo de porco com cubinhos de ananás.
O tamboril, macio, fresquissimo, em azeite,  a mostrar como pode ser boa opção em carpaccio. O salmão a vencer com a redução de laranja. Delicioso, o sonho de cogumelos aqui batizado de almondega. A carne, boa, mas a desiquilibrar a harmonia do prato.
Começo a baixar a guarda quando me surge a segunda triolgia: creme de abóbora, garoupa em molho de salsa com legumes de inverno e risotto de bouillabaisse com camarão e espuma de crustáceos.
Menos conseguido o creme de abóbora que para o meu palato dispensam-se as natas; muito bem tratada a garoupa, suada no molho de salsa; interessante o risotto feito com o caldo de bouillabaisse, ensopado feito com vários peixes, uma espécie de caldeirada tipica da zona de Marselha. No entando, aqui, dominou o leite de coco abafando a maresia.
O pedaço seguinte funcionou como prato principal só que, para mal dos meus pecados, tinha-me esquecido de avisar que cordeiro, borrego ou cabrito estão fora da minha lista de alimentos. Aviso obrigatório, mandaria a prudência, já que são as carnes mais utilizadas na alta cozinha. Meio atrapalhado, com o meu desconsolo perante o cordeiro, o empregado prontifica-se à substituição, sugerindo-me lombo de pato. Com a mesma guarnição, o marreco cumpriu a função.
No prato da frente, mantem-se o carré de cordeiro, com relatos elogiosos.
Na trilogia doce, foi apresentada uma irresistivel mousse de manga caramelizada; creme brulée com mel de alecrim e  gelado de amendoa,  o creme em textura de tigelada, a ganhar vida na conjugação com o mel; e ainda um brownie de chocolate a garantir o sucesso da composição.
Fiquei quase reconciliada com este restaurante e, ainda por cima tem a segunda melhor vista de Lisboa.
Numa carta de vinhos com preços altos, um Soberana tinto, a 40 euros, mostrou ser uma agradável surpresa. Apesar de estruturado, não se revelou pesado.
Joachim Koerper vale a estrela, haja maior inter-acção entre a cozinha e a sala. O serviço ainda a precisar de afinações, mas, na ligação entre a recepção e as mesas, Florbela a sobressair na eficência e atenção aos pormenores.
Em tempos de crise, o Eleven a mostrar como se pode ser competitivo e sensato, sem perder pergaminhos. Eu conto voltar. Terei mais onze razões para o tira-teimas...

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