“O prazer da comida é o único que, desfrutado com moderação, não acaba por cansar”

Brillat-Savarin


quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Henrique Leis – Numa noite de muita cor e pouco sabor





É já quase uma tradição. Em noites de luar, no agosto algarvio, procuro ter mesa marcada no terraço do Henrique Leis.
O restaurante fica numa curva, à beira da estrada velha que liga Almancil a Loulé e, se ignorarmos a vista mais próxima, a linha do horizonte que abarcamos a partir deste terraço é magnífica.
Mesmo com a crise, restaurantes deste nível - e este, ostenta uma estrela no Guia Michelin - não mostram sinais de estarem a ser afectados. Lotações esgotadas, as reservas tem de ser feitas com antecedência.
Não é o caso do restaurante da praia que frequento. Com muito bom peixinho e excelentes ameijoas, o certo é que, este ano, apesar do areal estar cheio como nunca, não se vêem as filas de anos anteriores. Oiço as queixas da restauração: “as pessoas dividem os pratos, escolhem os mais baratos. Até nos cafés se nota. Estão a beber menos bicas”. Imagino o que será com o anunciado/falado aumento do IVA…
Depois de algumas tentativas falhadas ou adiadas noutros restaurantes, aqui, no Henrique Leis, não arrisco. A mesa reservada com uma semana de antecedência. E lá está a lua, redondinha, a iluminar a noite.
A caminho, faço uma aposta: “ o amuse bouche que nos vai chegar à mesa vai ser o mesmo do ano passado” – aposta feita, aposta ganha. É a receita do ano passado, de há dois anos e de há três…até me perder na memória.
Lá veio a trilogia de melão e melancia, em shot, com um macarron de beterraba. Sem se dar por vencida, uma voz na mesa tentava, com alguma ironia, salvar a honra do convento: “também não mudamos de cartão-de-visita todos os anos! Ora, um amuse bouche é o cartão-de-visita do chef!”. Boa tentativa, mas o argumento não me convence, já que vejo estas delicadezas iniciais como uma montra que, convém, se vá remodelando!!!
Queixo-me do dejá vu, não me queixo do sabor. A frescura doce, como doce pode ser uma noite de verão algarvia. Melancia e meloa, a combinar com o suspiro de beterraba, com um sublinhado para o bonito efeito visual. O vermelho no fundo do copo, por cima o verde, com o shot a terminar numa espuma branca. Ao lado do copo, a brilhar, o doce de beterraba.
Peço emprestada a foto na net que a minha máquina fotográfica ficou de férias, em casa!

Por esta altura, as escolhas das entradas e pratos já estavam assumidas. Trilogia de foie gras para os nossos companheiros de mesa. Um clássico que Henrique Leis mantém, e bem, na oferta.
Tento aproveitar a renovação da carta e opto pelo tártaro de peixe-galo com legumes escabechados. À minha frente, a coragem de umas molejas com uma trilogia de raviolis! Pois! Dizem-me que sem vida. Comida passada.
Do foie gras, chegam-me os esperados elogios. Com o meu tártaro de peixe-galo, sobram as reticências. Minha nossa!!! Como é possível ter um prato tão bonito, à minha frente…sem sabor! Sem querer ser injusta, dou a provar a todos os que partilham a mesa comigo. Todos concordam! Lindo…mas, sem sabor!!! Fico triste. A frescura do peixe-galo é inquestionável, mas com que tempero? E onde está o escabechado dos legumes? Vejo canudinhos de várias cores, cada um deles corresponde a um legume, mas…sabem a quê? Que lhes aconteceu? OOONNN-DDDEEEE? Onde está o escabeche, por mais leve que seja?
Salva-se o conforto da lua. E a companhia. Seguem-se os pratos.
Uma dodine de pintada com foie gras. É o único prato de carne na mesa. Dodine, não significa mais do que uma pintada desossada. Uns escassos milímetros de pintada, grossos rolos de foie gras. Um todo mole e enjoativo, dizem-me. Bec!...Olho, encantada, para o meu prato.
No resto, as escolhas recaem no peixe. Uma dourada sem critica nem elogios, absorvidos no efeito visual do prato. Os olhos também comem, claro! Para mim, o linguado com um sablé de legumes! Mais uma vez, os pratos viram telas. Felizes pinturas. É a expressão das paixões de Henrique Leis: a cozinha e a pintura. O chef tenta transpor as telas para os pratos.
Grande jogo de cores. Desta vez sem muito sucesso. O que se ganha em cor, perde-se em sabor. Acontece.
Partilho a desilusão no dia seguinte, no areal da praia, com uns amigos, também eles clientes habituais do Henrique Leis. Que não, replicam. Tinham lá estado na semana anterior. Tinham comido, lindamente! Acredito! Mas eu não.


Restaurante Henrique Leis
8100-267 Almancil

Coordenadas GPS:
Latitude: 37.100706 Longitude: -8.022692
URL: http://www.henriqueleis.com/

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