“O prazer da comida é o único que, desfrutado com moderação, não acaba por cansar”

Brillat-Savarin


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Fortaleza do Guincho – O talento francês numa cozinha elegante

É um hotel de charme em cima do mar. De verão ou de inverno, gosto de lá ir, nas tardes de fim de semana. No bar, abrigada do quase permanente vento do Guincho e enquanto ponho a leitura dos jornais em dia, lavo a vista naquele horizonte. Faça sul ou faça sol, é sempre diferente. É sempre mágico.

Colada ao bar, está a sala do restaurante também aberta ao mar. Num e noutro, só destoa a decoração de gosto duvidoso a comprometer o que podia ser um casamento perfeito.

Escolhi a fortaleza do Guincho para fechar a semana do Lisbon Top chefs. Feliz opção. Acabei em grande o que começou mal.

Menu construido a partir da carta do restaurante, o festival de sabores composto por Vincent Farges começou com peito de faisão assado e creme de castanhas de Trás-os-Montes. O creme a deixar brilhar os sabores do assado. Nas papilas, saltam memórias de infância da cozinha da avó, com o assado apurado e bom tempero. Lascas de funcho crocante a dar-lhe uma inspirada pincelada de modernidade.

Abertura em grande e, a manter o tom, veio a seguir, o foie gras da região de Landes, chutney de figos com gengibre e vinho do porto e gelatina de moscatel. Nham, nham! Digo para mim mesma que vou voltar em breve só para comer este foie gras.

Até aqui, no copo, um champanhe rosé Charles Mignon, cortesia do restaurante. Fez boa companhia.

Preparada para “engolir um sapo”, resisti a pedir troca de prato e aceitei provar o fricassé de coxas de rã e girolles em lasanha com creme ligeiro de cerefólio. Desconfiada, confesso que estava pronta a fingir que comia, mas levada à boca a primeira garfada e vencido o preconceito fiquei rendida a este clássico da gastronomia francesa. O sabor do batráquio pode ser confundido com frango, mas mais doce e a carne macia.

Pedido a copo um branco, Dona Berta Rabigato Vinhas Velhas 2008: a cumprir bem na harmonização, ainda assim, foi desnecessário.  O Quinta do Crasto tinto 2008, que veio a seguir, teria aguentado todo o menu.

No peixe, mais uma vez a inspiração francesa. Robalo de linha salteado com trompetas da morte e canterelos, molho de matelote perfumado com jus de trufa. Harmonia de sabores. Não deslumbrou, mas manteve o padrão do conjunto.

Do talho, o menu a prever lombo de cabrito montês assado, refogado de couve roxa com especiarias, marmelos confitados e molho de vinho tinto. A descrição parece convincente, mas cabrito não faz parte da minha lista autorizada de alimentos. É a minha sina em restaurantes deste nível. O cabrito é, quase sempre, a carne eleita para o prato principal da carne, vá-se lá saber porquê! Mas o relato feito ao meu lado é de carne no ponto, macia, com a couve roxa agridoce em excelente harmonia.

Para mim veio um peito de pato selvagem assado com frutos de outono, salsifis e pastinaca glaceados, coxa salteada com cogumelos e uvas marinadas com verjus, molho poivrade. Em boa hora. A ave, rosada, macia, suculenta, perfeita. A carne a atingir o patamar da excelência num assado, mais uma vez, irrepreensível. Delicioso.

Eternamente gulosa, faço a prova das sobremesas: primeiro concha de merengue “Mont Blanc”, gelado de castanhas com xarope perfumado em rum velho; depois,  Frutos de Outono salteados com mel de Trás-os-Montes, strudel caramelizado e gelado de canela. Uma e outra de sabores delicados.

Na hora de misturar comida com vida alheia ergo o copo para a mesa do lado. Comemorava-se ali umas bodas de ouro.  Ao centro, uma cara conhecida  a homenagear a mulher de uma vida. Por umas horas, alheio à crise, ou apesar da crise, o comandante operacional do 25 de Abril! Nem mais. Otelo Saraiva de Carvalho. Quem diria que o homem que fez a revolução também se deixa seduzir por restaurantes de luxo! Revela bom gosto, sim senhora. Cozinha de cinco estrelas, premiada pelo guia Michelin e que se saiba, o ideário revolucionário não penaliza o pecado da gula! Touché!


Fortaleza do Guincho
Estrada do Guincho
2750-642 Cascais
+351214870491
reservations@quinchotel.pt
http://www.guinchotel.pt/hotel_em_cascais_guincho/restaurante.aspx

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